O que diz a Lei sobre os Crimes de Violação Sexual de Mulheres

A violação sexual de mulheres, Infelizmente tem sido recorrente na sociedade, no entanto, o abuso e a exploração sexual, também são manifestações dessa prática negativa, e é importante perceber o que diz a Lei em Moçambique, em relação à violação sexual, abuso sexual, e exploração sexual. 

Este tema é muito importante, pertinente, e actual, porque em meados de 2021, quando o mundo se se deparava com a maior pandemia do século 21, a COVID-19, a sociedade moçambicana, foi chocada com um mediático e repudiante caso de abuso sexual e exploração sexual de mulheres, na cadeia feminina de Maputo. 

Em meados de 2021, o Centro de Integridade Pública (CIP) divulgou um caso contendo um vídeo segundo a qual, mulheres  prisioneiras, denunciam serem vítimas de um esquema de exploração sexual, em que os guardas prisionais obrigavam-nas a se prostituírem. Segundo o vídeo, as mulheres prisioneiras, eram obrigadas a ter que se envolver sexualmente com homens, e em troca, estes pagavam valores monetários elevados aos guardas prisionais.

Apesar de ter sido feito um inquérito pelas autoridades que concluiu que haviam casos de violação e abusos sexuais de mulheres prisioneiras, perpetrados por guardas prisionais, desde lá para cá, não temos visto grandes reformas na segurança, protecção das mulheres prisioneiras, reformas nas cadeias femininas para garantir maior segurança das reclusas, e nem ouvimos que houve sanções ou condenação junto do tribunal, dos possíveis infractores e abusadores de mulheres.

Para além de casos de abusos e exploração sexual de mulheres prisioneiras, também tem se verificado casos de violação sexual de mulheres, praticados por agentes da Polícia, que é repudiante, porque estes é que deveriam proteger as mulheres, contra os infractores deste crime.

A título de exemplo, em Janeiro de 2022, foi reportado pela mídia local, um caso na província de Inhambane, no sul de Moçambique, onde uma mulher jovem de 21 anos de idade foi violada sexualmente por 3 agentes da Polícia e de investigação, facto que é no mínimo, lamentável.

Afinal, o que diz a Lei moçambicana em relação aos crimes de violação sexual de mulheres, exploração sexual e abuso sexual de mulheres?

A resposta a esta pergunta, pode ser encontrada na Lei n° 24/2019, de 24 de Dezembro de 2019.

De um modo geral, é importante salientar que a Lei em Moçambique, de facto, protege as mulheres contra o crime de violação sexual, o que é um aspecto positivo, que demonstra que houve várias reformas e debates que permitiram esse avanço.

Que tratamento dá a Lei para casos de  abuso sexual, exploração sexual e violação sexual?

A Lei acima referida – Lei do Código Penal ou Lei Criminal, define o que é o crime de violação sexual e estabelece as penas de prisão que são aplicáveis ao infractor ou infractores.

Segundo o artigo 201°, da Secção I, do Capítulo VII, da Lei n° 24/2019 de 24 de Dezembro, referente aos Crimes Contra a Liberdade Sexual, considera-se Violação:

“Quem tiver acto sexual com qualquer pessoa, contra a sua vontade, por meio de violência física ou intimidação, comete o crime de violação (sexual) e é punido com a pena de prisão de 2 à 8 anos.”

Portanto, nesta definição acima apresentada, está claro que o acto sexual praticado com alguém, com base no uso da força física ou “intimidação”, é considerado Crime de Violação (sexual), cuja a pena de prisão aplicável ao infractor é de 2 à 8 anos.

Ora, no caso que se deu, eu que as vítimas eram mulheres prisioneiras, esta definição enquadra-se, porque ainda que se possa dizer que não foi usada a “força física” de forma explícita, trata-se de violação sexual, porque o acto tendo sido praticado  por guardas prisionais ou por outros infractores sob influência dos guardas prisionais, aplica-se o termo de “intimidação”, e pode-se considerar que as mulheres prisioneiras acabaram envolvidas nestes actos de abusos e exploração sexual, por medo dos guardas prisionais, visto que estes exercem uma função de autoridade perante elas.

É importante referir, que a Lei não faz referência ao crime de “exploração sexual”, de forma explícita, mas o artigo 214°, n° 1, na Secção III, da referida Lei n° 24/2019, de 24 de Dezembro, faz referência à  Prostituição, e estabelece que:

“Quem, profissionalmente ou com intenção lucrativa fomentar, favorecer ou facilitar o exercício da prostituição por outra pessoa, é punido com pena de prisão de 1 à 2 anos e multa correspondente.”

Este artigo acima referido sobre a Prostituição, pode ser enquadrado no caso da exploração sexual de mulheres  ocorrido na cadeia feminina de Maputo, considerando que as mulheres prisioneiras, afirmaram no vídeo que foi publicado em meados de 2021, que elas eram obrigadas a manter relações sexuais com homens, que em troca, pagavam valores monetários aos guardas prisionais.

Portanto, apesar de, a Lei não fazer referência de forma explícita ao termo de “Exploração Sexual”, como um crime, este acto pode ter enquadramento no tipo legal (de Crime) de Prostituição – quando alguém obriga outra pessoa ou se aproveita de outra pessoa para esta ter relações sexuais com outra pessoa, em troca de valores monetários, que favorecem a pessoa que fomentou a prostituição por parte de outrem. 

Tratando-se de guardas prisionais, envolvidos nesses actos de “venda” do corpo de mulheres prisioneiras para a prática do acto sexual como um negócio que favorece a eles, a referida Lei do Código Penal, estabelece uma pena de prisão mais agravada, considerando que estes perpretadores directos ou indirectos (negociadores do corpo das mulheres prisioneiras), exercem um papel de autoridade, e aí verifica-se o abuso de autoridade, conforme refere o mesmo  214°, n°2 – sobre a Prostituição, da Lei n° 24/2019, de 24 de Dezembro:

“É punido com pena de prisão de 2 a 8 anos, quem cometer o crime, por meio de:

  1. Apor meio de violência ou ameaça grave;
  2. Com abuso de autoridade ou dependência hierárquica.”

Conforme foi acima apresentado, em termos da existência de uma Lei que criminaliza a exploração sexual, a violação sexual de mulheres, existe essa lei em Moçambique, que estabelece como sendo crimes quando há  o uso da intimidação, a força física, ou a negociação como forma de obter vantagem sexual usando o corpo de outra pessoa, e neste caso, usando o corpo de mulheres. Portanto, constitui crime, tanto o acto de exploração sexual das mulheres prisioneiras, assim como os actos de violação sexual de mulheres praticados por agentes da Polícia e não só.

Assim sendo, é  importante referir que as instituições de justiça, têm ferramentas jurídico-criminais, para poderem sancionar, condenar e reabilitar os infractores, independentemente de estes serem agentes, guardas prisionais ou policias, portanto, todos os que cometem o crime de violação sexual de mulheres têm o direito à medidas sancionatórias, que nos termos da lei penal moçambicana,  significa que os infractores devem ser condenados à pena de prisão, como forma de mitigar esse acto negativo, praticado contra as mulheres.

Em relação ao termo “Abuso Sexual”, trata-se de um termo mais referido na doutrina, e a Lei não refere de forma específica. No entanto, a mesma Lei do Código Penal, estabelece o Crime de Assédio Sexual, que também pode ser enquadrado nestes casos aqui mencionados, considerando que houve o abuso de autoridade por parte dos guardas prisionais assim como de agentes da Polícia, ao praticarem actos de abuso sexual contra mulheres, conforme explicado no artigo a seguir:

Artigo 205°, da Lei Lei n° 24/2019, de 24 de Dezembro – Crime de Assédio Sexual: 

“Quem, abusando da autoridade que lhe conferem as suas funções de superior hierárquico, no uso de cargo ou função, constranger alguém com intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, é punido com pena de prisão até 2 anos e multa correspondente.”

Quem deve fazer a denúncia?

O Artigo 209° da Lei n° 24/2019, de 24 de Dezembro, sobre a Legitimidade para fazer a denúncia, estabelece que:

“A acção penal do crime de violação sexual de mulheres é semi-particular, quando a vítima é maior de 18 anos de idade. Portanto, para que haja procedimento criminal por parte das instituições de justiça como a Procuradoria e os tribunais, a denúncia do crime de violação sexual deve ser feita pela própria vítima, ou pelos seus pais ou adotantes, avós, marido ou pessoa com quem a sobrevivente vive maritalmente, ou pelos irmãos, tutores ou curadores.”

No artigo acima referido, está claro que para o caso das mulheres prisioneiras ou mulheres vítimas, que tenham medo de denunciar os casos de exploração, abuso ou violação sexual, ou não podem denunciar porque estão em situação prisional, os seus familiares podem fazer a denúncia junto das esquadras da polícia, procuradoria, e esta por sua vez, tem o papel de instaurar o processo, fazendo a acusação para o tribunal julgar os infractores.

Quanto mais as pessoas souberem que podem e devem denunciar actos de violação sexual de mulheres, maior pressão haverá sobre as instituições de justiça para tomarem medidas que permitam a aplicação de sanções aos infractores e abusadores de mulheres. Também haverá mais pressão haverá de outros actores externos, para que as instituições de justiça possam fazer reformas junto das cadeias femininas, junto das escolas de formação de policias, para que as mulheres tenham maior segurança em relação a proteção do seu corpo, contra os Crimes de Violação Sexual. 

É necessário fazer reformas

Reformas sérias nas cadeias femininas e na escola de formação de policias, bem como a aplicação de sanções aos infractores-abusadores de mulheres, é necessário para a eliminação deste mal. Os Agentes da Polícia e guardas prisionais devem receber formação sobre direitos humanos das mulheres. Também deve haver um Código de Conduta sobre Violência Baseada no Género que deve ser aplicado para esses agentes, e caso seja cometido um um tipo de abuso sexual, exploração sexual ou violação sexual de mulheres, esses agentes deverão ser expulsos da corporação e cumprir com as consequências judiciárias. Isto é papel da Procuradoria e dos sistema de administração prisional e da justiça.

Acreditamos que essas reformas, um dia, serão feitas, para benefício e protecção de muitas mulheres.

“A mulher prisioneira e todas as mulheres, têm o direto ao respeito do seu corpo.”

By: APROFIT